_ Parou de fumar, hein?!
_ Pois é... Tá aí só no cafezinho, tia?
_ Café nada, gato; vinho. Deixei a menina na escola e vim aqui tomar um vinhozinho, vai?
_ Vou não, tô ind...
_ Nem pode, tem o pessoal da Lei Seca.
_ Lei Seca?
_ Ééé, se os caras te pegam rodando por aí doidão, apreendem sua cadeira! Rááá Rá Rá Rááá!
Nunca tive tanto amigo em boteco (e olha que eu já frequentei muitos). O bar aqui do lado de casa está sempre aberto. Sempre. E a hora que for vai ter alguém biritando. Conheço todo mundo por lá, só de passar pela frente. Tem a Bruxa do Mar, o Coroa da Bengala, o Botafoguense Maluco, só figura. Pode estar chovendo, ventando, não interessa: os caras metem um gorrinho na cabeça e vão marcar ponto no botequim. E a piada da vez é o papo da Lei Seca. Não sei quem inventou, mas está fazendo o maior sucesso. Na última semana ouvi um monte de vezes. Todo mundo acha que está sendo original. Antes de ir pro trabalho, parava lá pra comprar um maço de cigarro. Também ia pra assistir a tudo que é jogo do Mengão tomando uma cerveja. Hoje, circulando por aí, acabo interagindo com a rapaziada do pé sujo várias vezes ao dia. E bêbado é maneiro: solidário, simpático, prestativo, engraçado.
_ Ô da cadeira, vê se não bebe muito hoje não, tá?
_ Já sei, já sei, por causa da Lei Seca.
_ Rááá Rá Rá Rááá...
"Aqui vamos contar as histórias que forem acontecendo (algumas são inacreditáveis), vamos dar dicas de locais com relação a acessibilidade, vamos elogiar e criticar, além de divulgar o que estiver acontecendo por aí. Então é isso: Acessível é diário, utilidade pública e entretenimento."
segunda-feira, 26 de dezembro de 2011
terça-feira, 20 de dezembro de 2011
Pelo Olho de Thundera
Domingo a gente tentou ir ao teatro. A Gloria comprou os ingressos com antecedência, eu liguei pra bilheteria explicando que sou cadeirante e tal, me deram uma senha de garantia, chegamos meia hora antes do sinal, mas mesmo assim não deu pra ver a peça. Os lugares reservados (?) eram num fosso sem a menor condição de entrar com a cadeira. A responsável de lá era uma tal de Kátia, que mais parecia o Mun Rá antes da transformação (os mais novos podem procurar no You Tube em Thundercats). Primeiro disseram que eu não informei minha condição de deficiente quando liguei (telefonei pra que então?), depois que chegaria um cadeirante-fantasma pra ocupar um único lugar razoável que havia disponível, aí vieram as famosas frases que pintam quando os despreparados não sabem o que fazer: "Ele não anda nem um pouquinho?", "O senhor pode ficar despreocupado que a gente desce o senhor lá pro buraco", "Vocês esperem o espetáculo começar que aí tá tudo escuro mesmo e não tem essa de lugar marcado...", "Fica tranquila que a gente vai arrumar um cantinho pra colocar ele". Aí Mun Rá deu mole porque foi falar isso logo pra Glorinha. A Chefe até que estava resistindo bem ao festival de constrangimentos a que estávamos sendo submetidos, mas essa de "a gente coloca ele num cantinho" foi demais pra ela. A vilã de desenho animado foi lembrada gentilmente de que eu estava ali na frente dela (chato mesmo esse lance de falarem de mim como se eu não estivesse ali), de que mesinha de centro é que a gente arrasta pro cantinho e de mais um ou outro fato que ilustrava o absurdo da situação. Como não havia mais clima pra assistir a peça nenhuma, pegamos o dinheiro de volta e fomos embora antes que chegasse o Escamoso, o Abutre ou o Simiano pra completar a quadrilha e dar uma força pra Kátia. Engraçado é que antes da lesão eu podia jurar que teatro era um lugar tranquilo pra quem tem dificuldade de locomoção. Afinal é o tipo de evento que, além de caro, recebe bastantes idosos. A gente já conferiu doze salas diferentes até agora e a única que reúne condições próximas do ideal é a do Teatro Fashion Mall. Isso não quer dizer que a gente não vá aos lugares; na maioria tem como dar um jeito. Tudo depende de como as pessoas te tratam: de boa vontade, bom senso e bom humor. Agora, voltar ao Shopping Barra Square (onde fica o citado teatro) só se for de Espada Justiceira em punho. O lugar tem pinta de galeria antiga: elevador que não cabe cadeira de rodas, vagas especiais ocupadas por qualquer um ("Corre lá porque cê sabe como é que é, né? Nego num respeita.") e Praça de Alimentação com restaurantes com degraus na entrada. Talvez por isso estava às moscas no último fim de semana antes do Natal.
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